Egresso das centenas de graus centígrados de uma oficina de jornal diário, era, agora aos 13 anos de idade, um fascinado aluno do Ginásio da Bahia, o que me permitia trabalhar na sucursal em Salvador do jornal “Estado de São Paulo” como datilógrafo e copiador de notícias.
Caminhando pelas ruas da Cidade Baixa, pessoalmente ia distribuir um exemplar a empresários, assinantes do serviço.
Já se falava em direito de exprimir-se e não era novidade quando os homens do poder diziam, entre esgares de satisfação e amplos sorrisos, que não toleravam as ideias contra a liberdade de expressão, mesmo porque estavam convencidos de que era preciso entender e destacar que todas as liberdades são combinadas umas com as outras.
Ouvira falar de liberdade de pensar, de livremente exprimir nossas dúvidas, nossos desejos, nossos sonhos.
Aprendera que o jornal era o caminho mais direto para nos garantir a sobrevivência de nossas ideias.
Enquanto a polícia montada do tenente interventor nos encurralava na porta do colégio estadual, limitando, a golpes de espadas e cassetetes, nosso direito de expressão, sem problemas, no meu bairro, um jornaleco, datilografado em duas vias, era oferecido aos que se interessassem pela leitura.
O nome do jornaleco: ALARME. O título era sensacionalista, mas o conteúdo estava dentro da norma de usar as liberdades ajustadas entre elas, para contar o dia a dia do bairro às margens do Dique do Tororó.
Circulavam, semanalmente, um original e uma cópia carbono, Era esperado, porque o “Alarme” falava de gente, de vida simples, fazia inocentes fofoquinhas, gostava de destacar as meninas bonitas, que ainda namoravam caminhando aos domingos na pracinha onde o bonde tinha seu ponto final.
Até que um dia a manchete principal era “Plantei madrugada em teus cabelos 13”.
Um sábado, na pracinha, um “brutamontes”, irmão de uma linda garota de 13 anos, mostrou como combater o que para ele era um “excesso de liberdades”. Entendeu a seu modo o verso e obrigou o redator “Zé Linguiça” a comer e engolir em praça pública o jornaleco.
Foi o primeiro exemplo concreto que vivi de violência contra a liberdade de expressão. E ainda enfrentei muitas outras, nesta longa trajetória pela radiodifusão e pelo jornal... pelo mundo afora.
*José de Almeida Castro é jornalista e escritor. Foi presidente da Abert entre 1972-1974 e da Associação Internacional de Radiodifusão (AIR) por quatro mandatos. Colabora com artigos sobre temas ligados à radiodifusão.